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EM ALTO MAR, 1997-2006, foi apresentada uma característica que viria a ser comum na trajetória do coletivo: processos de caráter acadêmico saindo da sala de aula e adquirindo status de montagem profissional. Este texto de Slawomir Mrozek, escrito em 1961, é uma obra de estrutura dramática fechada. Três náufragos, perdidos em alto mar, famintos e sedentos, são obrigados a decidir qual deles servirá de alimento para os outros dois. O texto evolui por meio de uma série de acontecimentos absurdos que pontuam o humor de Mrozek, desde a realização de eleições com voto secreto até a chegada de personagens inusitados no barco à deriva. A dimensão existencial do conflito se acentua no contraste provocado pela miudeza humana diante da vastidão do mar e a impossibilidade da redenção nesse contexto de abandono. Autonomia e livre arbítrio são colocados em discussão – especialmente na entrada irônica de personagens vindos do continente – e, nesse sentido, aproximam-se do universo beckettiano, em que seres humanos não são necessariamente sujeitos de si mesmos. A palavra exerce papel fundamental na obra, pois o convencimento e o desdobramento do conflito estão baseados na lógica e na argumentação. O coletivo apresentou duas versões encenadas profissionalmente desse texto, a primeira em 1997 e a segunda em 2006.

A centralidade da palavra em performance é o elemento mais marcante na busca da teatralidade do texto de Mrozek. Na montagem de 1997, Adriano e Fernando alargam a amplitude existencial do mar por meio de um mural de televisões com imagens de céu. O recurso também serve como referência especial e geográfica, além de anunciar o interesse de um diálogo mais próximo com equipamentos tecnológicos de natureza não-teatral. A restrição do movimento surge mais uma vez como assunto de interesse do coletivo antes mesmo da encenação, na escolha do texto [cuja situação dramática se dá em espaço de confinamento]. O mar assume qualidade metafórica e funcionalidade visual formado por diversos aquários com peixinhos vivos dentro. A condição do peixe no aquário seria um espelho da condição dos personagens no barco – ou, quem sabe, do ser humano no mundo.

Em 2006, os diretores investem na comicidade do texto e em certo tipo de interpretação mais formal – como se os personagens não se cressem personagens, mas sujeitos de uma situação deflagradamente armada [teatral]. O mural de televisões retorna em um telão de fundo com projeções de céus e pássaros e em meio ao oceano – onde três aparelhos de TV submersos transmitem imagens reais de fundo do mar [peixes coloridos, corais, criaturas marítimas]. A qualidade absurda dos elementos visuais reforça o absurdo do texto e exacerbam sua dimensão metafórica, assim como na música Yellow Submarine, dos Beatles, que toca em diversas línguas e em diversos arranjos  durante a entrada da plateia no teatro. O interesse pelo submarino [aquilo que existe, mas não é visto em condições cotidianas] é o mesmo interesse pelo que está apenas sugerido, não-dito mas presente, lacunar [revelado em diversos outros trabalhos do coletivo]. A representação do mar assume novamente caráter conotativo e exerce, nessa montagem, função narrativa: uma espécie de tapete ondulado, volumoso e tridimensional, verde profundo e brilhante, formado por micropartes de plástico, que cobre todo o palco; roupas molhadas são roupas com pedaços de mar.

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