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Se IR E VIR, 1998-2011, indicam verbos de deslocamento, Beckett aponta nesta peça uma discussão sobre as noções de passado e de futuro – e, certamente, mais uma vez, de tempo. Como numa dança contida, três mulheres que outrora conviviam se reencontram e compartilham impressões e segredos umas sobre as outras. Entre uma fala e outra, as mulheres trocam de posição no banco em que estão sentadas [Beckett indica no texto o esquema visual da movimentação]. Ao definir esse roteiro de deslocamento, o autor define também um movimento de cores em cena, pois indica com que cores cada uma está vestida [e são sempre cores sem brilho, pálidas]. Por outro lado é irônico que o título da peça sugira deslocamento [que, de fato, acontece] e o banco opere como um contentor do movimento em relação ao espaço. Conter o movimento é uma escolha cênica reincidente nas obras de Beckett. Curiosamente, é também bastante comum na fase do Coletivo Irmãos Guimarães anterior ao contato com o autor irlandês. Desde a mesa de Provisioriamente Paixões passando pelo carrinho de Vestido de Noiva e pelo genuflexório de Dorotéia, há uma discussão sobre a mobilidade em nosso tempo e em nossas cidades, sobre o lugar do corpo, sobre a autonomia do sujeito; e isto se apresenta também nesta montagem, configurando um desafio que se funde entre o que propõe Beckett aos atores e o que propõem os Guimarães em termos de movimentação e criação física. A caracterização das personagens em Ir e Vir é outro elemento forte no discurso da obra: iguais, como num coro, ainda que com roupas em cores diferentes, não se desenham como personalidades, mas como sujeitas da ação. Nesse sentido, a contribuição de Ana Miguel – que, como figurinista, é uma importante parceira na busca de inserções autorais na controlada dramaturgia beckettiana –se desenha na luva cravejada de agulhas [como se estivessem revelando as ferramentas que as tricotaram e, logo, o mecanismo que as criou]. Também Adriano e Fernando interferem na informação do figurino ao descerem o chapéu até que tapassem os olhos, criando mulheres mais enigmáticas e subjetividades mais coletivas, como entidades.

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