DIAS FELIZES, 1998-2001, é a primeira resposta do Coletivo Irmãos Guimarães à dramaturgia de Samuel Beckett. Iniciam, com a realização desta montagem, o extenso movimento de diálogo com o autor irlandês que resultaria na tradução inédita para o português de suas peças curtas – missão capitaneada pela critica Barbara Heliodora – e no conjunto de ações artísticas que se denominariam, posteriormente, de Projeto Beckett. Como na maior parte dos textos beckettianos, a visualidade performativa da ação em Dias Felizes também exerce papel de destaque na proposição das metáforas, na produção dos sentidos e na criação de efeitos diversos. No caso de Dias Felizes, Winnie encontra-se enterrada até a cintura em um monte de areia no início da peça e termina enterrada até o pescoço: só se vê a cabeça; o restante do corpo fora totalmente soterrado. Beckett retoma essa imagem na peça curta Jogo. O curioso é que aqui o espectador acompanha o sumiço do corpo ao passo que em Jogo não há um passado do corpo que ocultou-se. Essa relação íntima com os efeitos da visualidade – que, aos poucos, vai tomando conta de mais partes da cena – e a tentativa de controle sobre ela [características de Beckett] provocam nos diretores Adriano e Fernando Guimarães o desejo de encontrarem sua autoria como encenadores nas brechas do que eles mesmos chamaram de uma sintaxe cênica muito controlada – em que sintaxe seriam as possibilidade de combinação linguística dos signos estruturantes no teatro. Substituem, por exemplo, o monte de areia por armários hospitalares, reiterando a qualidade surreal e absurda do espetáculo, mas inserindo novas camadas de sentido ao trabalho posto em cena. Os armários – como objetos e também como suportes da cena [ou do corpo] – atravessam a pesquisa sobre o universo beckettiano empreendida pelo Coletivo e remetem a temáticas como memória, duração das coisas, guardados íntimos, segredos.