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RASCUNHO PARA TEATRO II, 2003-2008, como o próprio nome sugere, é uma ode ao inacabado, àquilo que estar por terminar. Da ideia de inacabamento temos duas imagens possíveis: a primeira remete ao permanente e infinito estado de construção, em processo; a segunda, ao abandono que necessariamente irá produzir ruínas. Na narrativa, que Beckett inusitadamente situa em 1942, um homem de costas para a plateia está de pé no parapeito de uma janela. No palco, duas mesas iguais, equipadas com uma luminária cada, são os postos de trabalho de dois funcionários que tentam resgatar a partir de depoimentos de testemunhas o passado do homem na janela. Neste espetáculo, o ator principal não age; ele é vitima da ação [assim como o Protagonista de Catástrofe]. Em outras palavras, são os homens das mesas – com os depoimentos que têm misturados a outros papéis de burocracia – que vão, aos poucos, tentando reconstruir aquele homem historicamente, geograficamente. Sempre que chegam a uma conclusão, a luminária falha – e o inquérito [e, logo, o homem] segue inacabado. Esse deslocamento de identidade do homem, que o coloca fora dele mesmo, é apresentada na encenação de Adriano e Fernando Guimarães por meio de uma parede inteira escrita de giz, como um duplo daquele homem – e daqueles depoimentos. A letra, escrita à mão, parece desejar se afirmar enquanto traço identitário mesmo que inapropriadamente e fora do lugar – posto que não se escreve em paredes. Além disso, a qualidade efêmera da escrita à giz, peculiar da sua materialidade, que se apaga fácil, incorpora novos sentidos à narrativa.

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